COM FIM DA MP 927, VOLTA AO TRABALHO  PRESENCIAL SÓ COM MEDIDAS SANITÁRIAS

 

A Medida Provisória (MP) nº 927, publicada em março deste ano, perdeu o prazo de validade no último domingo (19) ao não ser votada no Congresso Nacional.  Com isso, pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) voltaram a valer, gerando muitas dúvidas, principalmente sobre o trabalho remoto, o chamado teletrabalho ou home office.

Muitas empresas estão se aproveitando da desinformação e utilizando a linguagem jurídica, o popular “juridiquês”, para pedir aos trabalhadores e as trabalhadoras que voltem à atividade presencial. Mas é importante ressaltar que o fim da MP 927 não interfere no Estado de Calamidade devido a pandemia, e com isso o teletrabalho pode ser mantido. O que mudou é que agora é preciso concordância das partes e a formalização deste tipo de trabalho, como prevê a CLT. Agora a empresa não poderá mais antecipar novas férias, realizar banco de horas negativo tão amplo, oferecer home office sem documento escrito e ainda precisa voltar a recolher o FGTS normalmente.

Segundo o secretário de Assuntos Jurídicos da CUT, Valeir Ertle, o teletrabalho foi legalizado na reforma Trabalhista, mas é preciso que os sindicatos negociem as condições, que muitas vezes estão insalubres e desumanas. Sobre a questão da formalização do home office, o procurador e Secretário de Relações Institucionais do Ministério Público do Trabalho (MPT), Márcio Amazonas, diz que se for do interesse do trabalhador e do empregador, o acordo pode ser individual entre trabalhador e empresa, porque parte do pressuposto que é bom para a empresa, mas os sindicatos podem atuar para melhorar as condições.

Se empresa insistir no retorno presencial

A responsabilidade de garantir todas as condições de saúde e segurança dos trabalhadores nos locais de trabalho, inclusive nos deslocamento casa-trabalho-casa, é da empresa. Se a empresa decidir pelo retorno ao trabalho sem proteção, como álcool gel, distanciamento, máscara, local arejado com circulação de ar, dentre outras medidas preventivas, e ainda exigir o retorno do trabalhador que for do grupo de risco a pessoa pode recorrer ao sindicato ou até mesmo ao Judiciário.

O procurador do MPT Márcio Amazonas afirma ainda que se a empresa exigir o retorno à atividade presencial e o trabalhador não se sentir protegido contra a Covid-19 porque o patrão não adotou os protocolos de segurança e saúde, ele pode se recusar a voltar por uma questão sanitária e de saúde pública, e deve denunciar aos órgãos competentes imediatamente. Segundo ele, caso o trabalhador opte em denunciar no MPT, tanto no aplicativo quanto no formulário online disponível no site, vai chegar a informação a um procurador, que será o promotor natural daquele feito e que poderá instaurar inquérito civil por entender que ali existe indícios de um ato ilegal e irregular praticado pela empresa.

Saiba o que mudou com o fim da validade da MP 927

Home office / teletrabalho – O empregador não pode determinar a mudança do regime presencial para o teletrabalho, precisa ser acordado entre as duas partes: empregador e trabalhador. Aprendizes e estagiários não podem mais atuar no regime de trabalho remoto. O tempo trabalhado pelo funcionário em regime remoto, além da jornada normal de trabalho, será considerada hora extra, e deverá ocorrer o seu pagamento.

Acordo individual x acordo coletivo – Com a MP 927, o acordo individual poderia ser preponderante ao coletivo, com mais peso. Com o fim da validade da medida, o acordo coletivo se sobrepõe ao individual, ou seja, precisa ter a intermediação do sindicato da categoria do trabalhador para mudar as regras que foram modificadas pela MP e agora voltaram a seguir a CLT.

Férias individuais e coletivas – O período de férias individuais volta ser comunicado com 30 dias de antecedência, e não mais em 48 horas. O período mínimo de férias individuais deve ser de 14 dias, o restante pode ser dividido em outros dois períodos. Não pode antecipar férias para o funcionário que não completou 12 meses como empregado, portanto, não tem o período aquisitivo para esse direito. O empregador não pode postergar o pagamento do adicional de 1/3 de férias e o abono pecuniário.

Feriados – Os feriados não podem ser antecipados, sem que isso tenha sido negociado em acordo coletivo.

Banco de horas – Para o caso de contratos que preveem o banco de horas, o mesmo deve ser compensado no acordo coletivo, que em alguns casos pode ser no prazo de três a seis meses. A MP 927 permitia a compensação em até 18 meses.

Segurança e saúde do trabalho – Os exames médicos ocupacionais devem ser feitos nos prazo normais. E os treinamentos estabelecidos pelas normas regulamentadoras também devem ser feitos de acordo com os prazos legais e de forma presencial.

Fiscalização – Os auditores do Trabalho podem atuar de forma fiscalizadora, inclusive com aplicação de sanções e multas.
Fonte: CUT

TRABALHO REMOTO NA PANDEMIA ACENTUA
DESIGUALDADES, DIZEM PESQUISADORES

A pandemia do coronavírus, que levou milhões de pessoas a trabalhar em suas casas, pode ter contribuído para acentuar desigualdades no acesso às tecnologias necessárias para o trabalho à distância, afirma um grupo de pesquisadores acadêmicos que estuda as políticas de combate à crise. Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que 5% dos trabalhadores executavam suas atividades em casa antes da chegada do vírus. Em sua maioria, eram trabalhadores autônomos, sem vínculo formal e de baixa renda, como vendedores, doceiras, costureiras e manicures.

Com as medidas de distanciamento social adotadas para enfrentar a pandemia, 10% dos trabalhadores ocupados passaram a exercer suas atividades em casa, mas os números do IBGE indicam que o deslocamento mobilizou trabalhadores com outro perfil, com maior grau de escolaridade e renda mais alta. Executivos, professores e profissionais liberais passaram a trabalhar remotamente durante a quarentena, aproveitando facilidades no acesso à internet que já tinham antes da pandemia, uma vantagem com o qual os trabalhadores mais pobres não contaram para se adaptar às mudanças causadas pela crise.

“A falta de conexão com a tecnologia limita o acesso de muitas pessoas às formas de trabalho remoto que ganharam impulso na pandemia, especialmente as mais pobres”, afirma Fábio Senne, do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), ligado ao Comitê Gestor da Internet no Brasil. De acordo com dados do IBGE analisados pelo grupo do qual Senne faz parte, ligado à Rede de Pesquisa Solidária, 26% dos gerentes e diretores de empresas passaram a trabalhar em casa com a pandemia, assim como 17% dos profissionais de apoio administrativo e 14% dos técnicos de nível médio.

Menos de 5% dos membros desses segmentos da força de trabalho exerciam suas atividades remotamente antes da pandemia, segundo o IBGE. Em outras áreas, ocorreu o inverso. Entre os trabalhadores do comércio e dos serviços, 8% trabalhavam em casa e só 3% passaram a fazê-lo com o vírus. Com lojas, bares e restaurantes fechados na quarentena, muitas dessas pessoas não tiveram condições de continuar trabalhando em casa e viram sua renda diminuir na pandemia. Mesmo com a reabertura da economia na maioria dos estados, a volta ao trabalho tende a ser lenta, dizem os pesquisadores.

Antes da pandemia, a renda média dos que trabalhavam em casa era equivalente a 66% da renda obtida por trabalhadores que exerciam as mesmas atividades fora de casa, diz o grupo. Em maio, a renda dos que conseguiram trabalhar em casa era 170% maior que a dos colegas que trabalhavam fora. A pesquisa mais recente sobre usuários da internet no Brasil, concluída pelo CGI antes da pandemia, mostra que 74% da população tem acesso à rede, mas a maioria navega pelo telefone celular, especialmente para trocar mensagens e navegar nas redes sociais. Poucos usavam a internet para trabalhar.

Na avaliação dos pesquisadores, muitos profissionais que passaram a trabalhar em casa na pandemia continuarão exercendo suas atividades remotamente mesmo após a reabertura da economia. Outros, sem computadores, conexão de banda larga e equipamentos para o trabalho remoto, ficarão para trás. O grupo defende mudanças na legislação que estabelece regras para o teletrabalho, sugerindo definições mais claras para separar horas de trabalho e descanso em casa e maior flexibilidade nas normas estabelecidas para fornecimento de equipamentos e reembolso de despesas pelos empregadores.
Fonte: Folha de São Paulo


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